Barros & Levy Cia. – Um judeu na economia do Amazonas

O estabelecimento comercial rapidamente prosperou porque soube bem aproveitar as oportunidades geradas pelo crescimento da exportação mundial de látex e o grande aumento de preço ocorrido neste período.

Por volta de 1870, Isaac Barros chegava em Manaus, um judeu marroquino nascido em 1850, na cidade de Celta (território sob soberania da Espanha, apesar da reivindicação do Reino de Marrocos), acompanhado de sua esposa e sobrinha dona Merssody. No Amazonas teve um começo de vida extremamente difícil, como empregado de diversas casas comerciais. Mais tarde, começou a se aventurar pelo interior do Estado trabalhando como regatão, comprando gêneros como: borracha, castanha, etc. Sua primeira investida neste ramo foi no Rio Madeira, onde comprou o Seringal Remanso, cujo título serviu como endereço telegráfico de sua empresa.

Em 1880 resolveu se estabelecer em Manaus fundando a Firma Isaac Barros, que havia de ser a origem e matriz da futura organização Barros & Levy, antecessora de B. Levy e Cia., fundada em 1895. Esta empresa veio da associação com seu sobrinho Samuel José Levy, também de Celta, a quem havia chegado do Marrocos logo no início do século.

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

O estabelecimento comercial rapidamente prosperou porque soube bem aproveitar as oportunidades geradas pelo crescimento da exportação mundial de látex e o grande aumento de preço ocorrido neste período. Samuel José Levy, como ocorria praticamente com todos os emigrantes judeus marroquinos, quando melhorou de vida com a nova sociedade, voltou à Celta para casar-se com dona Clara Parente, jovem bonita que tinha sido Miss Tetuam. Passou sua lua de mel no Seringal Remanso, onde nasceu sua filha mais velha, dona Alegria, que mais tarde emigrou para o Rio de Janeiro juntamente com seus irmãos José Samuel Levy e Jacques Levy.

Mas é com a entrada do novo sócio, Raphael Benoliel, no ano de 1902, que a empresa tomou novo impulso. Dessa forma, projetou-se com o nome de B. Levy como grande aviadora e depois exportadora de látex para o exterior. Foi durante os anos de 1909 a 1916 que houve uma grande expansão nos negócios da empresa. 

Porém, neste período, B. Levy mudou seus escritórios e armazéns para o prédio à Rua Marechal Deodoro, n. 25/27, esquina da Rua Theodoreto Souto e Avenida Eduardo Ribeiro, onde mais tarde foi sede dos correios em Manaus. Esse majestoso edifício é um dos símbolos do período áureo da borracha e foi construído na primeira década deste século pelos judeus franceses alsacianos Marius & Levy, que se notabilizaram na década de 1880 à 1900 como grandes fornecedores de mosaicos e obras de arte para construção do Teatro Amazonas, representantes que eram da famosa casa parisiense Kaoch Frès & Cia, de acordo com a narrativa no livro do historiador Mario Ypiranga Monteiro (vol. 1, página 29).

Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

É neste período que B. Levy & Cia. Tornasse um dos maiores concorrentes de J. G. Araújo, graças a suas conexões internacionais e o conhecimento com o mercado da Inglaterra, Alemanha, França e Estados Unidos, passando a exportar látex e castanha para os portos de Liverpool, Hamburgo, Havre e Nova York, conforme atestam os manifestos de carga da época.

O crescimento da empresa através de seus sócios Samuel José Levy e Raphael Benoliel, após a retirada para Portugal do seu fundador Isaac Barros, que passou a residir definitivamente em Lisboa, permitiu ainda mais o crescimento da empresa no interior do estado. Entre 1906 à 1920 Raphael Benoliel foi diretor e mais tarde vice-presidente da Associação Comercial, dominava fluentemente o português, espanhol, francês e inglês, afinal tinha sido educado em Tânger na Aliança Israelita Universal e mais em Lisboa, Portugal. Representou Associação Comercial em várias exposições internacionais de Londres e Nova York, com viagens frequentes a Lisboa, onde tinha sua residência com sua família. Foi fundador e primeiro presidente do Comitê Israelita do Amazonas, em 1929, prestando grandes serviços a comunidade judaica em Manaus.

Foto: Reprodução/Domínio público

Em 1914, Marius e Levy, proprietários do prédio, após terem encerrados seus negócios em Manaus, venderam este prédio para o Governo Federal que passou a ser usado pelo Correios e Telégrafos. Mudou-se para Rua Guilherme Moreira, n°150, com fundos para a Rua Marcílio Dias. Face a essa crise, B. Levy & Cia, sob o comando de Samuel José Levy, Raphael Benoliel, Isaac Benoliel e Rubens A. Israel, incrementando o seu negócio de castanha, fundaram a Usina Alegria de Beneficiamento de Castanha na Rua Joaquim Nabuco. Com essa tentativa na diversificação industrial agregaram mais valor a castanha, antes exportada a granel, o que permitiu a empresa alguns anos de sobrevivência. 

No entanto, com a chegada da Segunda Grande Guerra, a empresa B. Levy & Cia já bastante enfraquecida economicamente, visto que seus clientes não honraram os compromissos de financiamentos, preferiram entregar as propriedades e os seringais para a empresa, o que ocorreu com maioria dos seringalistas da época.

Samuel Levy e Raphael Benoliel saíram em busca de sócios para obterem maior capitalização. E, dessa forma, entra na sociedade o senhor Salomão Levy, um próspero e íntegro judeu que havia enriquecido em negócios de guaraná e pau-rosa, no município de Maués. Também entrou nesta sociedade Abraham Chocrom, um rico comerciante de Óbidos e bastante conhecedor de produtos regionais. 

A nova sociedade assim formada, porém, não durou muito por incompatibilidade entre os sócios e foi desfeita. Salomão Levy fez uma nova empresa com seu antigo amigo de Maués Manoel Negreiros, que se tornou grande exportador de couro de jacaré. Abraham Chocrom voltou para Óbidos, onde conseguiu tornar esta cidade o terceiro maior porto exportador de gêneros regionais depois de Belém e Manaus.

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

Cientistas avaliam como répteis e anfíbios lidam com mudança climática em ilha de Roraima

Expedição à Estação Ecológica de Maracá coletou mais de 400 espécimes para investigar como esses animais lidam com o aumento da temperatura previsto para as próximas décadas.

Leia também

Publicidade