Prazeres

Ouvi de uma querida amiga essa semana duas palavras que não ouvia a um certo tempo: disse ela que era fogosa e pervertida na hora do sexo, ou traduzindo numa linguagem de siglas PDTS. Até aí tudo normal porque cada um tem seus apetites e suas fantasias. Há quem diga que, prazer, sexo, emoções fortes, intensidades, são experiências dos anos dourados da vida. Quais serão, porém, os anos dourados da vida de alguém? E o que ‘doura’ esses anos? Na estereotipia dos olhares fixados na pele jovem, no corpo sarado, ágil e esbelto, na carne exposta, o lado de dentro do sujeito não é visto, sequer cogitado, como o lócus de grandes acontecimentos, onde se tecem possibilidades de grande prazer. 

A redução que se faz da experiência sexual, ao simples encontro e desempenho dos corpos, é empobrecedora, por superestimar o grau de eficiência com que os parceiros realizam suas proezas. Constata-se uma precariedade filosófica e ideológica, na sexualidade reduzida à busca do prazer pura e simplesmente, sem envolvimento. A sexualidade em qualquer idade, está nessa dimensão base, mas também para além desse desempenho, ela porta um mais além do corpo.

Foto: Reprodução/Shutterstock
Quando a cultura banaliza isso, reduz-se a experiência sexual, a uma ordem que nos aproxima mais daquilo que é vivido pelo animal, que da imensa potencialidade que atravessa o humano. A sexualidade está no corpo, na carne, na pele, no imaginário, na fantasia, na emoção, na sensibilidade, na estética, no espírito, na poética, no outro, na existência. No fundo, há mais sexo no imaginário, que nos genitais das pessoas. A maior barreira sexual é, em qualquer idade, a mordaça que se coloca na voz do coração. A felicidade não mora em nenhum recanto específico do nosso corpo, nem em nenhuma performance conseguida. 

A sexualidade amadurecida não se detém no terreno das necessidades, mas das potencialidades e sensibilidades. Em tempos maduros, em pessoas maduras, ela é mais expressão do viver com sabor, do que afirmação e desempenho. A sexualidade não tem idade. Ela pulsa na pessoa idosa, menos pela ordem do desempenho padronizado, e mais pela liberdade de expressar-se no afeto e no sentimento, que crescem sempre, se forem nutridos. Essa sexualidade, que aqui refiro como expressão do viver, não pode ser uma improvisação, mas fruto de uma história construída. Viver com prazer até o fim, é uma arte que se conquista ao longo da vida. É tarefa do existir. Transcrevo o depoimento de uma pessoa de 68 anos: O namoro começa no olhar. Nós podemos namorar com os olhos, superficial ou profundamente. Pode-se ir completando com o tocar as mãos, carícias, beijinhos, daí vai chegando a profundidade, onde chegamos ao ponto máximo, que nunca deixamos de desejar. Tomar banho juntos, dormir juntos, amanhecer juntos. 

Ao amanhecer, sentir o calor do namorado. Beijar sua boca quente, encostar peito a peito, sentir até o coração do outro, bater dentro do nosso próprio peito. Namorar…é até voar numa nuvem terrena!!! Leio esse depoimento como um hino à vida amorosa. É a própria expressão de um terno viver. Quem ousaria aí questionar se há desempenhos, ereções ou orgasmos? Quem negaria que isto seja vivência da sexualidade? Quem ousaria sugerir técnicas, estratégias ou pílulas para melhorar essa performance? O coração é um órgão que pode se manter erétil até o último sopro de vida.
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