Apesar das extensas terras, e talvez por causa disso, até hoje a agricultura no Amazonas não consegue deslanchar. Qual seria a questão, ou as questões, que emperrariam esse desenvolvimento? “Com certeza existe muita tecnologia desenvolvida em instituições como Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa), mas elas não conseguem chegar ao produtor rural.
A culpa não é do Inpa, nem da Embrapa ou de qualquer outra instituição de pesquisa porque não é obrigação delas levar adiante a tecnologia pesquisada e descoberta. Cabe ao Instituto de Desenvolvimento Agropecuário (Idam) fazer essa ponte”, falou Thomaz Meirelles, analista de operações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Para Meirelles, “o produtor rural é dependente do Idam, a quem cabe promover a extensão rural e a assistência técnica. Um complementa o outro. Na minha opinião, o primeiro passo seria estruturar a equipe de extensionistas. Hoje o Idam possui poucos técnicos para atender à gama de produtores rurais do Estado, e ainda existem aqueles contratados temporariamente. Ora, um trabalho desses leva meses para ser realizado, então, como será completado se o técnico tem tempo certo para ficar no Idam”, falou. Ainda de acordo com Meirelles, “o Idam é o órgão chave para a economia do Amazonas acabar com a dependência do Polo Industrial de Manaus”.
Utilizando a alta tecnologia “A alta tecnologia ainda não é adotada pelos agricultores familiares e produtores rurais para as culturas cultivadas no Amazonas. Existe a adoção por parte de agricultores e produtores de algumas tecnologias para a cultura de banana, laranja, hortaliças, criação de gado, aves e peixes, bem como na produção de mudas, manejo das culturas, aquisição de sementes e pintos de um dia.
Citaria como alta tecnologia a hidroponia (hortaliças), multiplicação de mudas de banana, controle de pragas e doenças nos citros, inseminação artificial em bovinos, sementes com poder de germinação em grau de pureza elevado e poedeiras para produção de pintos, entre outros”, exemplificou Airton Schneider, diretor técnico do Idam.
Atualmente, de acordo com Airton, o Amazonas possui 262.190 agricultores (Idam 2016) dos quais 62.049 (Idam 2015) são assistidos pelo Instituto, com apenas 325 técnicosde campo para atender a essa demanda e 1/3 destes, são temporários. “Mesmo com esse reduzido número de profissionais, conseguimos realizar visitas técnicas, reuniões, capacitação dos beneficiários, palestras, campanhas, elaboração de projetos de crédito rural, dentre outros importantes e necessários ao atendimento do público beneficiário deste serviço, que está diretamente relacionado à produção de alimentos”, garantiu.Airton listou as culturas produzidas no Amazonas: industriais (mandioca, guaraná, cana-de-açúcar, fibra (malva e juta) e cacau); fruticultura (abacaxi, açaí, banana, cupuaçu, laranja, mamão e maracujá); hortaliças (coentro, cebolinha, couve, alface, jerimum, macaxeira, maxixe e pimentão); produção animal: bovinocultura, bubalinocultura, avicultura de postura; e piscicultura.Histórias de sucessoHá 16 anos em atividades, a Hidroverde apresenta os bons resultados no plantio da hortaliça em Manaus. “Somos autossuficientes no fornecimento da alface para o mercado local”, revelou o proprietário da empresa, Paulo Hamada, que possui entre clientes as cozinhas industriais do Polo Industrial de Manaus e a rede de supermercados locais.Segundo Hamada, um dos precursores dessa modalidade de plantio em Manaus, atualmente produz 80 mil maços mensais de vários tipos de alface. Estima o empreendedor que haja no mercado local cerca de 30 produtores da alface hidropônica. A Hidroverde produz em mais de 30 galpões nos bairros Jorge Teixeira e Manoa.De acordo com o produtor, um galpão de 100 metros de comprimento por 6,5 metros de largura para cultivo hidropônico tem custo inicial de R$ 25 mil para uma colheita mensal de 3 mil a 3,5 mil maços. Como instituições parceiras, o empresário cita a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e o Banco da Amazônia. A hidroponia é um método diferente do plantio no solo, o cultivo é feito na água e com tubulações adequadas, de acordo com a área reservada para a produção.Paulo Hamada ressalta que há muitas hortaliças que poderiam ser plantadas com essa técnica, como o cheiro verde (coentro e cebolinha), rúcula, salsa e agrião. Para o empresário, um dos benefícios é a safra contínua de produção, porque independe do clima regional e sazonalidade dos rios, pois o plantio é feito em áreas cobertas, além de possuir melhor logística de colheita.Já a empresa Café Apuí, desde 2008, cultiva o fruto no município de Apuí, a 408 quilômetros de Manaus. “Iniciamos com plantação em pequena escala. Já triplicamos a produção de café de nove sacas de café por hectare para 20, mas ainda temos dificuldade em comercializar nosso produto que é 100% natural, orgânico, regional e totalmente amazônico”, afirmou o gerente comercial, Jonatas Machado.O gerente revela que a falta de estabilidade do mercado orgânico local é um dos agravantes do agronegócio de café, além do escasso incentivo. Quanto à parceria, o representante comercial acredita que a inciativa do Comitê irá contribuir para melhor colocação do Café Apuí no mercado, tendo uma rede de contatos que pode ser transformada numa base de parceria sólida.Futuro promissorUma das mais respeitadas instituições de pesquisa brasileira, a Embrapa está a mais de 40 anos no Amazonas. “Nossa missão é viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação para sustentabilidade da agricultura em benefício da sociedade”, falou Celso Azevedo, chefe adjunto de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa. “Realizamos, entre outros, pesquisas com guaraná, banana, mandioca, dendê, cupuaçu e citros. Desenvolvemos cultivares, práticas de adubação, espaçamento e aparelhos. Entre as nossas primeiras plantas pesquisadas está o guaraná, do qual já foram desenvolvidos 18 cultivares, cada um mais aperfeiçoado que o outro. Inventamos o desperfiliador de bananeira. Uma bananeira, para ser produtiva, precisa apenas da ‘avó’, da ‘mãe’ e da ‘filha’ no mesmo pé. Com o desperfiliador não deixamos a bananeira criar touceiras, ou seja, ter vários filhos. E o aplicador de fungicida. Antes, com o avião, o fungicida era jogado sobre toda a plantação, inclusive as pessoas. Com o aplicador, atingimos apenas a parte necessária da planta”, explicou.“E chegamos diretamente ao produtor através de pesquisas realizadas in loco nas áreas de produção. Depois, os resultados são repassados aos demais produtores da região. Também capacitamos produtores e multiplicadores, como os técnicos do Idam, e alunos. Realizamos o Dia de Campo, com atuação de nossos pesquisadores em áreas do Estado onde determinada cultura é mais desenvolvida, como o cupuaçu, em Presidente Figueiredo, por exemplo. Com certeza, nosso principal parceiro é o Idam, que pode ter alguma deficiência, mas sem o qual não conseguiríamos chegar aos 62 municípios do Amazonas”, assegurou.“Acredito que a agricultura ainda não é fortemente desenvolvida no Estado por fatores culturais. O homem do interior está acostumado ao extrativismo. Ele planta e cuida apenas para o seu sustento, sem pretensões de ampliar a área plantada, mas isso está mudando. Vejo a agricultura no Amazonas como algo muito promissor”, previu.