Natal mais amazônico? Pesquisador da UFPA analisa a regionalização dos símbolos da festividade

O pesquisador na Universidade Federal do Pará (UFPA), Romero Ximenes, analisa a fronteira entre o local e o global na nossa forma especial de enfeitar o Natal.

Árvores de miriti, guirlandas de açaí e anjinhos de patchouli. Símbolos que fazem parte de uma época do ano muito tradicional, o Natal, podem estar um pouco diferentes na Amazônia. Será “moda” ou outro fenômeno cultural e social? 

O pesquisador na Universidade Federal do Pará (UFPA), Romero Ximenes, fez uma análise sobre a fronteira entre o local e o global na forma especial de enfeitar o Natal na região amazônica.

Decoração de Natal 2020. (Foto:Divulgação/Pátio Belém)

Para o professor de Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH/UFPA), Romero Ximenes, a mudança e a incorporação regional nas decorações tradicionais do Natal acontecem porque tudo o que é exportado de um lugar para o outro tende a ser adaptado de acordo com as realidades locais. “A Amazônia pode entrar no mercado internacional vendendo tucupi para Paris, como vende açaí para os EUA. Mas ele entra na alimentação americana na lógica do fast food, e vira o açaí ‘made in USA‘ (feito nos EUA, em tradução literal). Aquele açaí congelado, com granola e confeitos”, exemplifica.

Tradição familiar

A arquiteta e urbanista Maria Dorotéa de Lima possui uma árvore de miriti em casa e a utiliza-a todos os anos, na decoração de fim de ano. “Vi numa exposição de arte várias árvores feitas com elementos regionais, achei muito criativo e o resultado, muito bom. Fiz contato com um artesão que começou a fazer essas primeiras árvores e comprei”, lembra Dorotéa, que também mostrou para vários amigos, inclusive de outros Estados, os quais resolveram comprar as árvores também. “Todos ficaram encantados! Até hoje tenho colegas que montam e me mandam fotos”, relata.

Árvore de miriti. (Foto:Divulgação/UFPA)

Ela conta também que sua admiração pelos itens vem de sua mãe, que gostava de fazer árvores de Natal com galhos catados da mata e com elementos regionais. “Talvez venha daí essa minha admiração, afinal, se nós formos pesar os prós e os contras, temos muito pouco a ver com o formato mundial de se celebrar o Natal, com neve, trenós e tudo mais”, pondera.

Tanto é verdade que, em um dos shoppings de Belém, as tradicionais bolas natalinas que enfeitam as árvores deram lugar a barcos, chapéus de palha, animais, como garças e cobras, além de personagens de miriti. A decoração foi intitulada ‘Ver-O-Natal’ foi usada em 2020 e atraia a atenção de todos que passam pelo local.

A estudante Ana Daniele gostou da decoração e acredita que é importante mostrar a cultura local, mas percebe que essa prática acontece de tempos em tempos. “É como se ficasse ‘na moda’ em um ano, aí, depois, as pessoas voltam para as decorações que nós já estamos acostumados a ver, até que a moda volte”, pontua. 

Ana também comenta que percebe como, mesmo os elementos regionais fazendo parte da decoração, a tradição mundial ainda é muito presente.

“As árvores, as bolas coloridas, as luzes, os animais, tudo isso são coisas que fazem parte da ‘normalidade’ das festas de fim de ano. Eu percebo que o que é feito, na verdade, é uma adaptação daquilo que nós já estamos acostumados a ver, e não uma criação de uma nova cultura”, afirma.

Tradição que influencia a modernidade

Para o professor Romero Ximenes, todo processo de transformação vai manter pelo menos uma parte das suas origens, pois “nada é absolutamente tradicional ou local, e nada é absolutamente moderno”. 

Ele também explica que, muitas vezes, é importante entender a tradição para que a modernidade faça sentido. “É como na política, a lógica profunda da política que se faz hoje é o que se fazia na época de Maquiavel, por isso ninguém aprende a lógica da política sem ler Maquiavel”, compara.

Além disso, segundo o professor, “a modernidade pode ser substituída por uma tradicionalidade que volta como novidade”, logo é natural que essas coisas apareçam como “moda” por um certo período de tempo e depois voltem a dar espaço ao que é considerado tradicional.

O antropólogo chama atenção, ainda, para o lado sustentável da prática: “Essa adaptação pode ser boa ou não, no caso, aqui, é boa. Porque você está usando materiais da floresta amazônica, que são materiais biodegradáveis, que, ao irem parar no lixo, se transformam em adubos, nutrientes para a terra, e não em elementos contaminantes, destruidores”.

Sejam pinheiros, sejam pés de miriti, guirlandas decoradas com cerejas ou açaí, Papai Noel de algodão ou anjinhos de patchouli, as festas e decorações de fim de ano trazem um clima único e especial à casa de todas as pessoas.

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