Veja quais lendas, mitos, figuras e rituais o Garantido levou para o bumbódromo no 58° Festival de Parintins

Foto: Aguilar Abecassis/SEC-AM

Com o tema o tema ‘Boi do Povo, Boi do Povão’, as três noites do boi-bumbá Garantido no 58° Festival Folclórico de Parintins, exaltam sua origem na Baixa da Xanda, suas conexões com os povos indígenas, quilombolas e a cultura popular brasileira em um conjunto de apresentações que dialogaram com o passado, o presente e as lutas contemporâneas do país.

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Veja quais lendas, mitos, figuras e rituais foram apresentadas ao público nesta edição:

1ª noite – 27 de junho: Somos os povos da floresta

Lenda amazônica – Tapyra’yawara

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

A Tapyra’yawara é uma figura mítica da Amazônia, descrita nas cosmologias de povos indígenas da região. representando não apenas um ser mitológico, mas também uma figura espiritual de grande poder e influência. O nome “Tapyra’yawara” é derivado do Tupi, onde “tapir” se refere à anta e “-iauara” à onça, resultando em uma representação que combina características de ambos os animais. simbolizando forças da terra e da água, da vegetação densa e das águas impetuosas, tornando-se um ser fundamental nas narrativas que tratam da interação entre seres humanos e o meio ambiente na Amazônia.

Desde o início da colonização da Amazônia os brancos têm ouvido dos indígenas suas histórias. Na crença do povo Maraguá, a Tapyra’yawara é um dos grandes e temidos espíritos dos felinos- um dos seis espíritos protetores da natureza, habita junto aos demais espíritos na Ãgaretama – o mundo espiritual, mas quando se manifesta, aparece exclusivamente nos igarapés. Entre troncos de árvores submersos, costumam nadar. E quando anda, de longe se ouve os barulhos dos galhos de paus quebrando enquanto passa. Seu cheiro forte é quase insuportável, porém é sua maior característica. Quem o sente, tem grande dor de cabeça e tonteira.

Tapyra’yawara atua como um protetor das florestas, prevenindo a exploração desenfreada e o uso irresponsável dos recursos naturais. Esse espírito das onças é visto como uma espécie de vigilante que, ao observar as ações humanas, pode intervir de maneira punitiva, especialmente quando detecta práticas prejudiciais ao meio ambiente, como a caça excessiva e o abuso dos recursos da floresta. Sua intervenção é vista como uma forma de restaurar a ordem e corrigir os desequilíbrios provocados por aqueles que infringem as leis naturais.

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Figura títpica regional – Povo Negro da Amazônia

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

Em sua apresentação explica que o povo negro da Amazônia é diverso, presente do Acre à foz do rio Amazonas. Vozes silenciadas por séculos agora reverberam por autoafirmação e lutam por certificações de territorialidades quilombolas, urbanas e rurais. Gente como o Mestre Irineu, criador do Santo Daime no alto rio Juruá; como Dona Xanda, líder quilombola de Parintins, mãe do mestre Lindolfo, criador do Boi Garantido; e como o mestre Damasceno, da Ilha do Marajó, são exemplos de lideranças de uma afroamazoneidade que partilha saberes, territórios e vidas com os povos originários.

 Quando soam os tambores nas festas de São Sebastião e São Benedito, em várias comunidades amazônicas, esse povo negro e plural expressa sua cultura e fé em caboclos, encantados, voduns e orixás, fazendo a gira girar na busca constante por paz, direitos e liberdade. O Garantido, boi do Quilombo da Baixa, que tem o branco da paz de Oxalá e o vermelho da justiça de Xangô, neste ano regido por Iansã, apresenta no item 15, Figura Típica Regional: O Povo Negro da Amazônia

Ritual indígena – Moyngo, a iniciação maragareum

Os Ikpeng vivem na região do Médio Xingu, segundo os anciões, o pajé Maragareum, em um transe profundo, recebeu revelações das deusas ancestrais: rios de almas cantando em tons sombrios, homens-peixe ossificados emergindo das águas, onças aladas rugindo no céu e uma floresta habitada por primatas medonhos e escorpiões de fogo. Para romper o ciclo do mal, os Ikpeng realizam o rito de iniciação Moyngo, no qual um primogênito é escolhido para proteger os segredos da terra.

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

O menino iniciado recebe a fumaça ancestral, que permite aos espíritos sagrados tatuarem seu rosto com os signos das feras da mata e dos rios. Ungido com as ervas ankuingo, que carregam os segredos da floresta, ele é revestido com a otxilat, uma armadura divina que o protegerá em sua jornada pelo mundo dos mortos. Camuflado com a tez da floresta, o iniciado percorre um caminho obscuro até a maloca do céu, onde deve encontrar os segredos da terra e vencer o mal.

Em um estado de nirvana induzido pela fumaça e pelo rapé, o pajé Ikpeng-txipaya enfrenta e vence as feras antagônicas, abrindo o caminho para o iniciado retornar como um guerreiro vidente. Guiado pelas árvores caminhantes, que guardam os segredos da terra, o jovem Ikpeng assegura a continuidade da floresta sagrada e da linhagem de seu povo, evitando que a floresta e sua cultura desapareçam. Essa narrativa épica e ritualística revela a profunda conexão dos Ikpeng com o cosmos, a natureza e a luta pela preservação de sua identidade e sabedoria ancestral.

2ª noite – 28 de junho: Terra brasileira

Lenda Amazônica – A lendária epopeia de Tamapú

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

Na era pré-colombiana, tempo da formação de impérios e grandes cacicados, quando humanos e animais se falavam, quando natureza e cultura se entrelaçavam em amores e lutas, o guerreiro Tamapú se apaixonou pela princesa do Palácio dos Ossos, a mulher ave de rapina com corpo plumado, a filha do rei do império dos urubus. Esse amor será levado à prova.

O Urubu Rei submeterá Tamapú a sacríficos e torturas. O Guerreiro vai enfrentar camirangas, carcarás, aranhas e formigas gigantes, só assim poderá se casar com princesa. O amor superará a dor. Da paixão vem a coragem e força que faz o guerreiro derrotar os gigantes do temido reino dos urubus. A princesa se despe da plumagem, se torna uma bela cunhã, a Cunhaporanga que com Tamapú viverá!

Figura típica regional – Tacacazeira da Baixa

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

A criação do tacacá é atribuída às raízes culinárias indígenas. Indícios apontam que o prato é uma variação da mani poi, uma sopa que era consumida pelos povos originários do Brasil muito antes da chegada dos europeus na região. O primeiro registro escrito de que se tem notícia sobre o tacacá, remonta ao século XVI, de autoria do padre capuchinho Abbeville em sua descrição das práticas alimentares indígenas (Câmara Cascudo, 2004). A palavra tacacá deriva do nheengatu ou língua geral, o tupi veicular da Amazônia.

Seu preparo e consumo continuam sendo preservados de forma autêntica pelos habitantes da região, que mantêm viva a tradição ancestral. A mandioca brava, um ingrediente fundamental na elaboração do tacacá, é um símbolo de grande relevância no Brasil, tanto cultural quanto historicamente.

É vendido em barracas nas ruas, praças, arraiás e feiras de Parintins, o tacacá não é apenas uma iguaria local, mas um símbolo de pertencimento e resistência cultural. As tacacazeiras são as responsáveis por preservar e transmitir essa tradição, muitas vezes herdada de suas mães e avós. Na Baixa do Boi Garantido, durante o período do Festival Folclórico de Parintins, o aroma do tacacá se mistura ao som dos tambores e ao colorido das apresentações, criando uma atmosfera mágica e inesquecível. As tacacazeiras, com seus trajes típicos e sorrisos acolhedores, são parte fundamental dessa festa, oferecendo não somente o alimento, mas também um pedaço da história e da identidade do povo parintinense.

Ritual indígena – Ritual Ajié

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

Na cosmovisão Madija Kulina, existem os mundos da terra e da água, o submundo e o mundo superior. Tocorimes são espíritos, seres não humanos habitantes destes universos. O ritual Ajié é a grande festa anunciada, rica e farta de comida, bebida, música, dança e alegria. Chegam Madija Kulina dos rios Jutaí, Purus, Juruá e os parentes Kanamari, Katukina e Kaxinawá.

Quando maracá, jojori e torori espalham seu som pelo ar, é sinal que o Ajié vai começar. Tinturas de urucum e jenipapo lhes darão a aparência da onça. O rapé e a ayahuasca os levarão a patamares sobrenaturais. Cantos evocam tocorimes dos vários mundos. O urutal é mal presságio. A confraternização se fragmenta, a festividade alegre se torna tensa, os conflitos espirituais afloram, o temor se espalha, a guerra é iminente. Somente a grande força do Tocorime Onça poderá apaziguar e trazer a alegria de viver aos Madija!

3ª Noite – 29 de junho: Bois do Brasil

Lenda Amazônica – Deusa das Águas

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

O Boi Garantido apresenta na 3ª noite o item 17, Lenda Amazônica, a ‘Iara, a Deusa das Águas’. Na Amazônia profunda, existe uma deusa guardiã: a senhora dos rios, lagos, igarapés e paranás. É a fascinante Iara, um ser com cauda de peixe e corpo de mulher.

Presente nos remansos e corredeiras, dominando banzeiros nos furos e peraus, Iara pune aqueles que ameaçam suas águas, mas protege os que sabem viver em harmonia com seus mananciais. No reino das águas de Iara, botos e tantos outros seres encantados celebram sua existência. Em noite de festa, chegam Mariana, Janaína e Iemanjá, mães das águas que vieram homenagear a deusa protetora das águas da Amazônia.

Figura típica regional – Artesã indígena

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

Para o Garantido mulheres artesãs representam a força da luta ancestral em defesa de suas culturas, territórios e modos de vida tradicionais. O artesanato das mulheres indígenas expressa saberes milenares, transmitidos de geração em geração. São grafismos, cerâmicas, cestarias, artes plumárias, colares, pulseiras, brincos, braceletes, cocares e maracás. No passado colonial, toda essa riqueza material foi tomada para compor coleções em museus ao redor do mundo.

Hoje, são verdadeiras joias feitas de sementes e fibras naturais, um tesouro ecológico que reafirma a identidade e garante renda para as mulheres Tikuna, Kokama, Baniwa, Sateré-Mawé, Hixkaryana e tantas outras indígenas da Amazônia. As artesãs indígenas são guardiãs da floresta; suas artes são sublimes formas de preservação. São elas as homenageadas nesta noite, no item 15, Figura Típica Regional.

Ritual indígena – Ritual Bahsesé

Imagem: Reprodução/Revista Garantido 2025

Bahsese é um ritual de cura do povo Tukano, da região do Alto Rio Negro, que trata seus doentes por meio de uma medicina milenar baseada nas forças cósmicas.

Saúde, doença e cura estão entrelaçadas com as forças do universo. Para acessar essas forças, o povo Tukano conta com os kumuã, pajés que exercem atividades especializadas na arte milenar de curar, por meio da inalação do patu, kahpi, tabaco e paricá, que permitem a transcendência ao cosmo.

São três os kumuã especialistas na cura ritual do Bahsese: yai, que transcende e identifica a doença; o kumu, que prepara o corpo do paciente para a cura; e o baya, que evoca a força de Buhpó, o “avô do mundo”, ordenador do cosmo e senhor de todas as forças do universo.

Para o povo Tukano, Buhpó é o princípio e a essência de todo o conhecimento necessário para se alcançar a cura.

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