Iniciativa inédita no Brasil usa drones para monitorar botos na Amazônia

Uma parceria entre o Instituto Mamirauá e o WWF-Brasil realiza a estimativa populacional de botos amazônicos em Tefé (a 523 quilômetros de Manaus), no Amazonas, com uso de drones. A ideia da iniciativa é coletar dados por meio de vídeos e estabelecer um modelo de utilização do equipamento para a contagem dos animais. 

Miriam Marmontel (à esquerda) e outros pesquisadores do Instituto. Foto: Amanda Lelis/Instituto Mamirauá

“O projeto-piloto foi realizado no lago Tefé durante dois dias e permitiu testar diferentes altitudes e velocidades de voo com o drone, assim como diferentes ângulos da câmera. Após a análise das imagens geradas, será possível definir os parâmetros mais adequados e desenvolver um algoritmo de identificação automática de botos”, explica a pesquisadora do Instituto Mamirauá, Miriam Marmontel.

De acordo com ela, a metodologia aplicada atualmente envolve cerca de dez pessoas, posicionadas na proa de um barco que, com os olhos fixos na água, registram os animais avistados em um raio de 180º. Depois disso, o número de animais vistos passa por análises estatísticas para obtenção da densidade e abundância de animais.

“A premissa do método é que todos os animais presentes sejam contados, mas sabemos que existem erros, associados à capacidade do observador avistar o animal, e à disponibilidade do animal, por exemplo, se estiver mergulhando, não será avistado”, explicou a pesquisadora. A expectativa é utilizar o drone no mesmo trajeto feito pelos pesquisadores, registrando o rio por meio da câmera. Miriam diz que, a partir das imagens registradas, seria possível corrigir a estimativa de população dos botos, preenchendo as lacunas deixadas pelo método atual.

Marcelo Oliveira, especialista de conservação do programa Amazônia, do WWF-Brasil, explica que a utilização de drones como auxílio em atividades de conservação do meio ambiente não é novidade. Fora do Brasil, a tecnologia já foi utilizada em diversas pesquisas científicas. No entanto, no País, a estratégia é ainda incipiente.

“O projeto já nasceu com a ideia de reunir instituições que tivessem interesse ou expertise na área. Há um ano, fizemos um workshop e começamos a discutir a proposta e, primeiro, entender o que estava sendo feito no Brasil. Observamos que era muito pouco, principalmente, por conta da legislação na época. A ideia principal desse projeto com os botos é: como essa tecnologia pode trazer impacto de conservação? Então, será que, com uma metodologia mais barata, não ampliamos o conhecimento da distribuição dos animais na Amazônia?”, comentou Marcelo.

A parceria entre o instituto de pesquisa brasileiro e a organização internacional busca testar e aprimorar técnicas e metodologias para a utilização de drones em pesquisas científicas. A proposta é utilizar os equipamentos para otimizar atividades de campo que exigem grande esforço da equipe e alto investimento de recursos. O projeto executado em Tefé integra a iniciativa Ecodrones Brasil.

Dados ajudam na criação de estratégias

Miriam Marmontel é especialista em mamíferos aquáticos e coordena projetos sobre peixes-bois, cetáceos e lontras amazônicos no Instituto Mamirauá. Ela destaca que a ausência de dados populacionais sobre os animais dificulta a elaboração de estratégias de conservação, pois as informações dão o cenário do real status das espécies para estudos de viabilidade populacional. 

Pesquisadores em atividade de campo com os drones. Foto: Amanda Lelis/Instituto Mamirauá

Para se ter uma ideia da importância dos dados, na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, em inglês), as duas espécies de boto que ocorrem na região, o boto vermelho (Inia geoffrensis) e o tucuxi (Sotalia fluviatilis), atualmente são considerados com ‘dados insuficientes’, em decorrência da limitada quantidade de informações sobre suas populações, ecologia, taxas de mortalidade, entre outras.

O boto vermelho já foi classificado anteriormente como ‘vulnerável’ à extinção e, em 2008, teve seu status modificado em razão da carência de dados sobre a espécie. No Brasil, entretanto, é considerado ‘ameaçado’.

“Mamíferos aquáticos amazônicos tendem a deslocar-se para diferentes ambientes de acordo com a variação do nível d’água, oferecendo desafios a seu monitoramento. Botos e ariranhas, por exemplo, seguem os peixes para dentro do igapó quando a água sobe, e o peixe-boi migra de uma área de várzea para lagos profundos de terra firme quando o nível do rio cai. O uso de drones representa uma forma de atacar este problema, possibilitando estudos de deslocamentos, uso e ocupação de habitat, e estimativas populacionais ao longo do ano”, esclarece Miriam.

De acordo com a pesquisadora, após os testes, a tecnologia poderia ser utilizada em diferentes pesquisas e também com outras espécies de vertebrados amazônicos.

“A ideia dessa atividade foi tentar identificar gargalos, o que funciona bem ou não com esse modelo de drone. A gente já viu que funciona, mas tem limitações. Já começamos a imaginar cenários em que funciona muito bem. E, agora, vamos conversar com pessoas que já trabalham com isso. Já temos as perguntas para ir atrás de respostas”, comentou o especialista da WWF.

Marcelo Oliveira reforça que o projeto inova em ser o primeiro a utilizar a tecnologia para monitoramento populacional de botos. “Primeira vez no mundo que é feito com mamíferos aquáticos em rios amazônicos. Já houve registro de comportamento de botos. Mas um censo, ou densidade populacional nunca foi feito”, disse.

A próxima etapa da expedição será no Rio Juruá, no período de 14 a 22 de novembro. A saída será do município de Tefé, pelo Solimões, percorrendo o Rio Juruá até o dia 22. A expectativa da equipe é chegar até a Reserva Extrativista do Médio Juruá. A pesquisadora ressalta que, apesar de ser uma tecnologia relativamente nova no Brasil, sua utilização vem se expandindo em pesquisas com vida silvestre e recursos naturais. “Os resultados de estudos já feitos com vida silvestre, e especificamente com botos, ariranhas e sirênios (peixe-boi e dugongo) levam a crer que o emprego da tecnologia representará um diferencial nos estudos em áreas protegidas”, comentou. 

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