Carnaval de Manaus começa com a Kamélia

Esse ano o Carnaval vai acontecer no mês de fevereiro e como já é tradição há 60 anos, a boneca Kamélia chega para animar o período momesco dos manauaras nesse sábado (6). Em 2018 a Kamélia completará 80 anos, desde a sua primeira versão, de 1938, com apenas 75 cm de altura, comprada na loja 4 e 400, até a atual, moderna e com quase três metros de altura.

Roberto Sá Gomes, o Beto da banda Blue Birds, surgida em 1967, lembrou que durante as décadas de 1970 e início de 80, a banda animou todos os Bailes da Kamélia, no Olímpico Clube. “Só paramos de tocar lá a partir de 1982, quando fomos contratados pelo Tropical Hotel para animar o Baile do Havaí, e ficamos no hotel por mais de 30 anos”.

Beto recorda da maratona que a banda enfrentava na época do Carnaval tocando, além do Olímpico, em todos os demais clubes da cidade: Rio Negro, Ideal, Bancrévea, União Esportiva Portuguesa, Sírio Libanês, Sulamérica, Cheik, a maioria hoje não mais existente. “A carreata com a Kamélia saía do Olímpico e seguia até o Rio Negro, que fazia seu baile no mesmo dia, e lá os foliões se juntavam. Naquela época as festas eram diferentes. Os bailes tinham data certa e todos aguardavam ansiosamente pela sua realização. As músicas tocadas eram marchinhas, que até hoje animam bastante qualquer baile, porém, atualmente o que se ouve nas bandas de rua é axé, Anita, Safadão, nada a ver com o Carnaval de antigamente. As bandas atuais não tem um repertório carnavalesco. As pessoas podem até se divertir, mas de outra maneira. Penso que antigamente era bem melhor”, lamentou.

Foto: Rede Amazônica/Arquivo
“O que notamos, já há alguns anos, foi o fim dos bailes em clubes, com o surgimento das bandas de rua. O Baile da Kamélia é praticamente o único que continua a acontecer, como uma tradição de décadas e com a animação de sempre. É uma amostra, para o pessoal de agora, de como se brincava Carnaval há algumas décadas”, falou.

Pelas ruas do bairro

O jornalista e escritor Cláudio Amazonas nasceu e vive no bairro de Educandos, vizinho à Colônia Oliveira Machado, bairro onde fica o antigo aeroporto de Ponta Pelada, pelo qual, supostamente a Kamélia chegava a Manaus, vindo de avião, da Bahia. Por isso até hoje fala-se na chegada da Kamélia.

“Na minha infância e juventude, nas décadas de 1960 e 70, lembro da carreata passando pelas ruas do bairro levando a Kamélia para o Olímpico Clube. Era uma festa. Geralmente ela chegava de noite e ia direto animar o baile. Para mim, ainda jovem, era difícil frequentar o Olímpico, porque era distante daqui, mas eu ia sempre à União Atlética de Constantinópolis, o mais famoso e bem frequantado clube que o Educandos já teve, frequentado por muita gente da alta sociedade baré”, contou.

“Quando já estava na faculdade, na década de 1970, passei a frequentar o Cassan, na Colônia Oliveira Machado. Os bailes eram animados e sem maldades. Quando tocava aquela marchinha ‘corre-corre lambretinha’, as pessoas se enfileiravam, uma segurando na cintura da outra, circulando pelo salão. Acho que se fizer isso nos dias atuais, vai ser considerado assédio sexual, mas naquela época tudo era Carnaval”, recordou.

“Sinceramente eu nunca fui carnavalesco. Ia para os bailes pra paquerar. Meu irmão Erasmo, sim, é carnavalesco. Há mais de 30 anos realiza o ‘Carnaval de Educandos’, na praia do Amarelinho, reunindo em torno de 70 mil pessoas”, concluiu.

Encontro nada agradável

O historiador Geraldo dos Anjos tem um livro pronto, faltando ser editado, sobre a história do Carnaval de Manaus, incluindo o começo e a evolução da Kamélia nos carnavais de rua da cidade, depois passando para o Olímpico Clube, e tem uma história bem curiosa sobre a negona baiana.

“Antigamente era comum as pessoas serem sócias dos clubes. Meu pai era sócio do Rio Negro, do Nacional e do Ideal, e como tínhamos familiares sócios do Olímpico, também frequentávamos esse clube. Eu participava dos bailes de Carnaval desde muito pequeno, na década de 1960. Um dia meu pai resolveu nos levar para ver a chegada da Kamélia, no Ponta Pelada. Dizia-se que ela vinha num avião da PanAir, da Bahia. Enquanto aguardávamos, eu, moleque danado, fui brincar pelos locais mais distantes do aeroporto e eis que entro numa sala e dou de cara com a Kamélia, guardada lá dentro, esperando para o começo da festa.

Tomei um susto tão grande ao ver aquela negra gigante na minha frente, que saí correndo pelo saguão do aeroporto, gritando de medo”, riu, e completou. “Apesar desse primeiro encontro nada agradável, desde então, por anos seguidos, passei a ir ver a chegada da Kamélia no Ponta Pelada e depois no Eduardo Gomes. A última vez foi, acho que em 2005, 2006, quando ela chegou pelo roadway, de barco”, explicou.
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