Ondas de frio: cidades da Amazônia já registraram friagens históricas

Segundo especialistas, este fenômeno pode se tornar mais raro, principalmente nos grandes centros urbanos da região

Quem nunca sonhou com o dia em ver o Largo de São Sebastião, no Centro de Manaus, branquinho, coberto de neve? Mas esse sonho parece distante, afinal a Amazônia não combina muito com o frio… ?

O meteorologista e mestre em Clima e Ambiente Willy Hagi lembra que a região amazônica tem dimensões continentais. “A Amazônia é muito grande e existe também uma diversidade climática muito grande”, pontua.

Vale lembrar que algumas regiões da Amazônia já estão acostumadas com o friozinho das frentes frias, especialmente a partir do mês de julho. “Tem regiões que são mais afetadas e outras, menos”, ressalta Willy. Na Amazônia, a entrada do ar frio é conhecida como friagem.

Foto: Arquivo/Agência Brasil

Os moradores dos estados do Acre, Mato Grosso, Rondônia e da região sul do Amazonas já estão mais acostumados com temperaturas mais baixas. O meteorologista explica que essas regiões estão na rota das ondas de frio.

“Essas massas de ar polar entram na América do Sul e, quando elas são muito fortes, sobem um pouquinho o continente e passam como se fosse uma onda por essas regiões”

Willy Hagi, meteorologista

Mas não se anime tanto. Willy ressalta que quem mora em outras cidades, como Manaus e Belém, acaba pegando só o “restinho” das friagens. “Esses fenômenos operam de formas diferentes em regiões distintas”, lembra.

Apesar de demorar para tirar o casaco do armário, o especialista destaca que, no passado, os termômetros já marcaram índices consideravelmente baixos em toda a região. “Historicamente, a gente tem registro tanto de dados quanto de notícias”, diz.

❄️ Friagens históricas

O professor e doutorando em Geografia Ivan Linhares Ribeiro explica que, durante o inverno, “o sul da Amazônia sofre forte influência de frentes frias que ocasionam bruscas alterações nas condições meteorológicas, causando uma diminuição da temperatura e umidade do ar e modificando as características ambientais”.

Em Manaus, a maior friagem marcou 17,8 °C, em julho de 1975. Foi o dia mais frio em 119 anos de medição de Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). As baixas temperaturas não duraram muito e na tarde do mesmo dia os termômetros já marcavam 27 °C.

Em Rio Branco, a menor temperatura registrada pelo Inmet foi de 2,6 °C, em maio de 1996. Em julho de 1975, a capital acreana chegou a marcar 6 °C. Por lá, não é muito incomum ver temperaturas abaixo dos 10 °C nos termômetros.

O titulo de menor temperatura registrada em Vilhena é de 3,4 °C, também em julho de 1975, na clássica onda de frio invadiu o Brasil chegando até mesmo em Roraima. Em 1994, outra intensa friagem também atingiu em cheio a região provocando resfriamento, com mínima de apenas 5,6 °C. Na capital, Porto Velho, as temperaturas variaram entre 6 e 10 °C.

Temperaturas mínimas registradas na década de 2010 no Amazonas

Efeitos das baixas temperaturas

O meteorologista Willy Hagi alerta que as friagens podem até causar aquela sensação gostosinha de colocar um bom casaco ou passar a manhã enrolado no lençol, mas também trazem consequências negativas. 

“A piscicultura sofre muito porque os eventos de friagem deixam um rastro de peixes mortos. Quem produz ou tem viveiro acaba perdendo um número bem razoável de peixes”, pontua.

Willy também destaca os efeitos sociais das quedas de temperatura. “Além disso tem as populações mais vulneráveis, como os moradores de rua, que, inevitavelmente, sofrem mais”, continua.

E dá pra tirar o casaco do armário?

Quem quiser sentir um friozinho pode enfrentar algumas dificuldades, principalmente fora das regiões já acostumadas com as friagens. É que o crescimento das cidades acaba provocando um efeito que os cientistas chamam de ilha de calor urbana.

“A área urbana é mais quente que a área de vegetação nativa. Então, a temperatura nesses locais acaba crescendo muito além do que deveria ser”, explica Willy.

Para vencer as ilhas de calor, as massas de ar frio têm que ser muito mais fortes. “Além das limitações geográficas, a gente tá falando de um bloco de concreto imenso e que esquenta muito”, acrescentou o meteorologista.

Além do crescimento urbano, o desmatamento e as queimadas na Amazônia também afetam o clima, alterando desde a ocorrência de chuvas até os períodos de chuva e seca nas cidades. “Isso não é projeção. Isso já é observado na nossa região”, conclui.

Mas para quem ainda tem esperança de tirar mais uma vez o casaco do armário, Willy lembra que você não ir muito longe. “Pode ir para o Acre ou Rondônia, que certamente vai sentir mais frio”, brinca o especialista.

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