Estudo mostra que a barreira dos rios influenciou na criação da biodiversidade vegetal da Amazônia

A hipótese criada em meados do século XIX por Alfred Russel Wallace, é reinterpretada na tentativa de explicar a influência na diversidade das plantas através das barreira feitas pelos rios da bacia amazônica

Estima-se que existem aproximadamente 50 mil espécies diferentes de plantas na Amazônia. Em apenas 1 hectare da região, apresenta uma variedade de espécies vegetais superior à Europa inteira.

Um dos fatores que podem ter contribuído para a produção da biodiversidade vegetal na Amazônia é a chamada barreira natural constituída pelos rios de grande porte, impedindo que algumas espécies existentes no território ao longo de uma das margens. A antiga hipótese proposta em meados do século XIX pelo cientista Alfred Russel Wallace com o objetivo de explicar a distribuição de espécies de primatas na Amazônia.

A teoria explica que os grandes rios, como o caso da bacia amazônica, podem reduzir ou impedir o fluxo gênico entre as populações de plantas nas margens opostas dos rios, ocasionando a diferenciação de espécies por conta do isolamento geográfico.

“Fizemos um estudo que, em termos genéticos, é uma reinterpretação da hipótese de Wallace. Segundo essa reinterpretação, grandes rios, como os da bacia amazônica, poderão reduzir ou impedir o fluxo gênico entre as populações de plantas nas margens opostas dos rios, acarretando alopatria (diferenciação de espécies em decorrência do isolamento geográfico) e restringindo as espécies a regiões interfluviais específicas”, conta Alison Nazareno, professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

O estudo foi realizado por Nazareno e coordenado por Lúcia Lohmann, professora do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP). Os resultados foram divulgados no periódico Frontiers in Plant Science.

Foto: Reprodução / Edson Grandisoli

“Nós estudamos a influência de 2 rios na diferenciação das espécies: o Negro, que é muito antigo e extremamente largo em algumas porções, e o Branco, um rio bem mais recente e estreito. Verificamos que o Branco não constituiu barreira para o fluxo gênico. Mas o Negro, para algumas espécies, a exemplo da Amphirrhox longifolia, da família das violáceas, constituiu uma barreira sim”, diz Lohmann.

Os pesquisadores ressaltam que os estudos no rio Negro foram um dos primeiros a usar espécies vegetais para testar a hipótese de Wallace, que já era muito bem assentada no caso dos animais vertebrados, com diversos estudos documentando a importância dessa barreira para aves e primatas.

No rio Branco, os pesquisadores investigaram representantes de 4 famílias vegetais: as bignoniáceas (ipês, os jacarandás e diversas lianas), as passifloráceas (maracujá), as rubiáceas (à qual pertence o café) e as violáceas (à qual pertencem algumas violetas). E consideraram espécies com 3 tipos de dispersão: pelo vento, pela água e por animais. 

Foto: Reprodução

 A pesquisadora explica que a espécie Amphirrhox longifolia é disseminada por peixes. Mesmo assim, o Negro representou uma eficiente barreira para a dispersão gênica. “É preciso considerar que, em certos trechos, o Negro chega a ter dezenas de quilômetros de largura entre uma margem e outra, representando uma barreira extraordinária. Os próprios peixes que dispersam sementes desta espécie frequentemente apresentam nichos restritos e não alcançam a margem oposta do rio”, informa Lohmann.

No artigo, os autores explicam que, para testar se os modos distintos de dispersão

de sementes têm um efeito similar no nível de conectividade genética (ou seja, no fluxo gênico) entre populações de diferentes espécies de plantas ribeirinhas, foi usado um tipo de marcador genético conhecido como polimorfismo de nucleotídeo único não ligado para 8 espécies de plantas.

Isso sugere que foram fatores ecológicos e não geográficos que desempenharam papel fundamental na história evolutiva das plantas na bacia amazônica. “Esses resultados podem ajudar a melhorar as políticas de conservação e manejo nas matas ciliares amazônicas, onde as taxas de degradação e desmatamento são tão altas”, comentam os autores.

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