Cheia do rio Negro deve alcançar nível acima de 29 metros, aponta previsão do Inpa

A cheia do rio Negro para este ano, em Manaus, deverá alcançar um nível de 29,04 metros com uma margem de erro de 30 centímetros para cima ou para baixo (28,74 a 29,34 metros). A informação tem como base o modelo matemático de previsão de cheias do rio Negro desenvolvido pelo pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC), Jochen Schöngart, do Grupo de Pesquisa Ecologia, Monitoramento e Uso Sustentável de Áreas Úmidas (MAUA).

Pelo modelo, este ano haverá uma cheia que potencialmente causará problemas na cidade de Manaus e nas zonas rurais da região. De acordo com o pesquisador, o modelo de previsão é uma ferramenta importante para se fazer previsões e evitar possíveis desastres com antecedência de três meses do pico da cheia, normalmente ocorrendo no mês de junho na região da Amazônia Central. 
 

Foto: Cimone Barros/Inpa
A partir de 2012, Schöngart adotou uma nova metodologia que integra mais parâmetros independentes para fazer uma nova modelagem e mais “robustas estatisticamente”, reduzindo o erro médio da previsão para 30 cm para cima e para baixo.

O pesquisador explica também que a nova modelagem de previsão de cheias utiliza uma série temporal longa de dados disponíveis a partir de 1951 até 1990, que foram utilizados para fazer a calibração do modelo, além de dados de 1991 até os dias de hoje para fazer a validação e testar se o modelo é capaz de prever cheias com antecedência de mais de três meses.

Em comparação com o mesmo período do ano passado, o rio Negro, até o dia 15/03, estava com 1,30 metros acima do nível na mesma data marcando 25,81 metros. Porém, em comparação com os meses anteriores o rio encheu pouco neste mês de março, passando por um fenômeno chamado de repiquete nos últimos dias, que é a estagnação do nível das águas até uma pequena descida.

“Este fenômeno é acentuado em anos de El Niño, caracterizado pelo aquecimento das águas superficiais do Pacífico Equatorial na região central-leste. Este ano, as anomalias de temperaturas das águas superficiais indicam a evolução de um El Niño fraco que geralmente afeta as cabeceiras das regiões do norte, central e leste da Bacia Amazônica”, explica Schöngart.

Pelo monitoramento das sub-bacias, realizado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), os rios Negro e Branco possuem níveis da água abaixo das médias observados neste período, mas os rios Solimões e Madeira possuem níveis expressivamente altas para este período do ano. O Negro na região de Manaus atinge seu nível máximo geralmente na segunda quinzena de junho.

O pesquisador lembra que no Porto de Manaus há um registro excepcional de medições do nível da água que começaram em setembro de 1902. Trata-se de uma série histórica longa que abrange mais de 116 anos. Depois de uma série de cheias extremas, o modelo prevê novamente uma cheia acentuada acima da média das enchentes históricas.

Tendência

Segundo Schöngart, tem-se observado nos últimos 30 anos a tendência de aumento de cheias que resultaram nas duas maiores cheias no registro de 2009 (29,77 metros) e 2012 (29,97 metros). Com as cheias nos anos subsequentes de 2013 (29,50 metros), 2014 (29,33 metros), 2015 (29,66 metros) e 2017 (29,00 metros) a região passou por seis cheias extremas durante os últimos dez anos. No período antes da década de 1970 somente nos anos de 1953, 1922 e 1909 foram registradas cheias severas passando o nível crítico de 29 metros. “Este aumento da frequência e magnitude de eventos extremos das cheias é resultado de uma intensificação das Células de Walker”, explica o pesquisador Schongart.

Esse sistema influencia padrões climáticos e pluviométricos principalmente em regiões tropicais movido pelas diferenças de temperaturas e pressão atmosférica sobre os oceanos tropicais, particularmente os oceanos Pacífico e Atlântico e como eles interagem.

Devido ao forte aquecimento do Oceano Atlântico e ao resfriamento do Pacífico no mesmo período a convecção e precipitação intensificou na Amazônia, principalmente nas regiões central e norte da bacia. O Pacífico mudou recentemente de uma fase fria para uma fase quente, porém a tendência de aquecimento do Atlântico tropical deverá continuar nos próximos anos.

“Sabe-se também que oscilações multidecadais (oscilações de baixa frequência que não mudam ano por ano e sim ao longo de décadas) também têm fortes influências no regime, como, por exemplo, a Oscilação Multidecadal do Atlântico que tem mais influência nas secas e a Oscilação Decadal do Pacífico que tem influência no regime de cheias.

A hidrologia da Amazônia é complexa pelas dimensões da maior hidrobacia do mundo com quase 20% da descarga de água doce para os oceanos. Os três grandes oceanos influenciam a convecção e precipitação na Amazônia pala variação ano por ano da temperatura nas superfícies, mas também pelas oscilações de baixa frequência ao longo de décadas.

“Isto mostra a complexidade da hidrologia na Amazônia e a necessidade de sofisticar os modelos de previsão conforme que o nosso conhecimento sobre os fatores que influenciam a Amazônia e os mecanismos por trás disso avança”, destacou Schöngart.

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