Esse foi o maior naufrágio da história do Amapá e um dos episódios mais tristes dos rios da Amazônia. Os sobreviventes ainda têm vivas as memórias daquele dia de terror e pânico
Há quatro décadas, centenas de pessoas perdiam as vidas e outras ficavam marcadas para sempre por uma tragédia que hoje acredita-se que poderia ter sido evitada. O naufrágio do barco Novo Amapá completa 40 anos nesta quarta-feira (6).
Viajar de navio era o modo mais importante e tradicional de locomoção na época na região. A embarcação partiu de Santana, às 14h, no Rio Amazonas, e naufragou pouco antes das 21h, do dia 6 de janeiro de 1981. Superlotado, o navio tombou no Rio Cajari, próximo ao distrito de Monte Dourado, em Almeirim, no Pará, onde seria o destino final.
O Novo Amapá, segundo o inquérito marítimo nº 22.031, do Departamento Regional da Marinha no Pará, tinha 25 metros de comprimento com suporte para transportar no máximo 400 pessoas e meia tonelada de mercadoria.
À época, a Capitania dos Portos havia registrado cerca de 150 passageiros, conforme lista cedida pelo despachante do barco. No entanto, o barco teria partido do porto de Santana com mais de 600 passageiros e quase uma tonelada de carga comercial, informou investigação à época.
Esse foi o maior naufrágio da história do Amapá e um dos episódios mais tristes dos rios da Amazônia. Os sobreviventes ainda têm vivas as memórias daquele dia de terror e pânico, e alguns têm até sequelas.
Um deles é o João Benjamim Santos. Ele estava voltando para Laranjal do Jari para trabalhar após o recesso de fim de ano e detalha que sobreviveu seguindo conselhos do pai.
“Meu pai sempre falava ‘quando viajar [de barco], não beba [bebida alcoólica], e nem ande de calça comprida, sapato, nada. Ande de bermuda e sandalhinha’. Nós éramos 8 [colegas]. Eu abri a bebida, meti na boca, quando eu levantei, me lembrei da palavra do meu pai, e eu parei. Não bebi mais. O desastre aconteceu desde aí. Foi um sufoco [sic]”, recorda.
Muitos passageiros dormiam, ou estavam em camarotes, e próximos do porão, e não conseguiram sair. Eram muitas pessoas.
Santos descreve que foi um dos últimos a serem resgatados do local e que ainda teve forças para ajudar, assim como outros sobreviventes, a salvar algumas pessoas, até mesmo quem estava preso ainda na embarcação.
“Nós quebramos [o casco] e tiramos 8 pessoas de dentro e uma senhora cega. Ela ainda veio com vida, mas com o ar puro ela não aguentou. Ela faleceu. […] Eu ajudava de toda maneira. Eu agradeci a Deus pela minha vida, mas vinha aquele pitiú de sangue na minha boca. Era muita água. Esse barco tinha mais de 600 pessoas. Era muita gente [sic]”, pontua.
Ele só viu a família 2 dias depois da tragédia. Apesar de todas as memórias dos momentos ruins, Santos mudou a forma de viver. Ele detalha que viu como é importante dar valor à vida e à ajudar o próximo.
“Eu era uma pessoa legal, mas agora… não pode chegar ninguém na minha casa e dizer que precisa de um prato de comida, e eu dizer não. Até hoje, eu gosto de ajudar um pouco. Eu não posso ajudar muito porque sou pobre também. Mas se precisar, alguma coisa eu consigo. Porque nós não somos nada nesse mundo. Somos irmãos e a gente tem que ajudar o outro. Na minha casa é assim. É uma nova vida”, comentou.
Escrito por Por Fabiana Figueiredo, Kelison Neves e Nixon Frank