Maria Albina: fortes lembranças do Luso

Maria foi uma grande frequentadora do Luso Sporting Clube.

Maria Albina Ribeiro da Costa, nascida em 24 de julho de 1931, na cidade de Manaus, filha de Manoel Ribeiro e Angelina Soares Ribeiro, ambos portugueses de nascimento e brasileiros de coração. Meu pai era sócio do Luso Sporting Club.

Eu sempre fui uma grande frequentadora do Luso Sporting Club, pois moro em frente. Quando criança, estudei na Escola João de Deus, cuja diretora e professora chamava-se Suzete Gonçalves, de uma pulso Forte, sabendo conduzir os alunos com muita dignidade. A escola funcionava do 1º ao 5º ano primário.

Todos os anos, no dia 1º de maio, aniversario do Luso Sporting Club no dia 5 de outubro, Dia de Camoês, o Luso de engalanava com hasteamento das bandeiras: brasileira, portuguesa e do Luso. As bandeiras enfeitavam a fachada da sede do clube e os alunos da Escola João de Deus se postavam na frente do prédio, para cantarem o Hino Nacional, o Hino Português e o Hino da Escola.

Maria Albina, Célia Rodrigues, Sr. Constantino, Ernesto Costa, esposo de Maria Albina. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

A seguir saiamos em passeata, debaixo de grande foguetório, com a gloriosa banda da Polícia Militar a frente, tocando marchas hilariantes, que tocavam nossos corações de tanta alegria e emoção. Neste trajeto visitávamos o cônsul de Portugal, o Sr. Moisés Cruz, cujo, consulado e moradia ficava na Rua Barroso, canto com a 24 de Maio. Depois dessa visita, seguimos pela Avenida 7 de Setembro até o Palácio Rio Negro, onde cumprimentávamos o governador do Estado do Amazonas, o sr. Álvaro Maia. A festa se prolongava até a noite e os alunos se postavam na entrada para aplaudir a chegada das autoridades. Havia muito falatório e, também muitos aplausos, pois discursavam as autoridades presentes.

Na Escola João de Deus havia aulas de bordado e de desenho, os alunos que mais se destacavam recebiam presentes e medalhas de honra ao mérito. Os presentes e medalhas eram entregues pelo governador do Estado do Amazonas e os presenteados ficavam felizes e muito orgulhosos. Foi uma época muito gratificantes.

Agora vamos para o Corpo Cênico: – Eu sempre fui convidada, para cooperar. Gostava imensamente de me apesentar no palco. Comecei nas pastorinhas. Pastoral do Luso, no ano de 1938. Os primeiros papéis foram de anjinho e borboleta, papéis adequados para as crianças. Ao passar do tempo, já crescida, fui convidada para ser o Anjo Gabriel, depois Nossa Senhora, Pastora Perdida, Caçador, Florista, Cigana e os Galeguinhos. Eu era a Galeguinha.

Uma das cenas vibrantes do Pastoral do Luso Sporting Club era a dos diabos. Eles saiam do palco e pulavam para a plateia, metendo medo aos espectadores. Algumas crianças choravam, gritavam e se escondiam por debaixo das cadeiras e outras enfiavam os rostos no colo dos pais.

Maria Albina Ribeiro da Costa aos 18 anos, em 1947. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

 Os diabos tentavam São José, Rei Herodes e a Pastora Perdida, mas, sempre eram dominados pelo Anjo Gabriel, que aí então se transformavam em dragão e morriam derrotados pela lança do Anjo.

Ainda hoje, pessoas que me conhecem desse tempo me chamam de Anjo Gabriel e de Nossa Senhora.

A peça das pastorinhas do Luso, foi apresentada no Cine Guarany e no Teatro Amazonas, uma coisa impressionante, os espetáculos sempre superlotados, era a oitava maravilha da época.

Meu filho caçula fez parte das pastorinhas, participando do grupo dos diabos e ainda hoje guardo a fantasia dele como lembrança. Hoje é sócio-proprietário do Luso, devido a morte do api dele que legou ao filho o título. Seu nome é Carlos Ribeiro da Costa.

Foram levadas pelo Corpo Cênico muitas peças teatrais e eu cito algumas como: Amor Louco, Um erro judicial, A filha do saltimbanco, João Corta-Mar, Os milagres de Santo Antônio, A vida de Cristo, Alvorada, Sai da porta Deolinda, Flor da Aldeia, O garçom do casamento (grande comédia que fazia a plateia soltar estrondosas gargalhadas), A rosa do Adro, O judeu (esta peça de deixou realizada, pois foi um grande sucesso), A filha do estalajadeiro e outras mais que já não lembro o nome.

Essas peças foram abrilhantadas por pessoas de muita boa vontade e muito amor pela arte, Cito algumas: João Carreira, Antônio Martinho, Fernando Maravalhas, José Campos, Porfírio Lemos (Faísca), Bibiano, Maria Albino Ribeiro da Costa, Maria de Souza Siqueira, Graziela e Lídia Fontes., José Lameiras Bea, Tereza Matos, Lídia e Nair Mendes, Fernanda Centeio e outras mais.

O sucesso de nossos trabalhos era o companheirismo, a união e o respeito, por isso tudo dava certo e o sucesso era total. Essas peças quando levadas em cena, tinham os dias de espetáculos pagos e os dias dedicados aos sócios.

Existia o Rancho Folclórico com vestimentas portuguesas que era grande sucesso. Sempre era apresentado em dias de festas (aniversario do Luso e Dia de Camoês). Outros eventos também eram realizados no balneário.

Um fato muito importante acontecido na sociedade, foi a vinda do presidente de Portugal a Manaus-Amazonas, do sr. Craveiro Lopes. Foi uma verdadeira apoteose. Fizeram um tapete de serragem colorida, desde a porta principal da sede do Luso, descendo a rua Tapajós até a rua 10 de julho. A homenagem prestada ao presidente de Portugal foi muito emocionante e marcante para a vida do clube (Luso). O presidente foi presenteado com um grande casco de tartarugas, muito bem polido e com pinturas de paisagens importantes da nossa Manaus. Uma grande obra de arte.

Sra Angelina Soares Ribeiro, mãe de Maria Albina, em 1947. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Sempre houve muita solidariedade entre os simpatizantes e os diretores do Clube. Ficávamos até as 2 horas da madrugada enfeitando os salões, com serpentinas, baloes, bandeirolas, máscaras carnavalescas, etc. Foram festas animadíssimas, com filas quilométricas para entrar no clube, para brincar o carnaval.

Um fato muito descontente aconteceu em uma das festas. Se não me falha a memória, foi em uma terça-feira de carnaval. Um grupo de rapazes jogou nos salões uma grande porção de pimenta murupi. Foi um desastre, pois os foliões que estavam dançando e pulando o carnaval, começaram a espirrar e, os olhos irritados ardiam, assim bem como a garganta irritada. Foi o fim da festa, pois não havia como remediar a grande maldade acontecia numa festa que estava em pleno auge de alegria carnavalesca.

O Luso é de um ambiente tão sadio e aconchegante, que no meu trajeto pela sociedade, enamorei-me e casei-me com um rapaz chamado Ernesto Costa, que era português. Ele foi aluno da Escola João de Deus. Também deu uma grande parcela de colaboração no corpo cênico. Como diretor de Esporte. Levou o time de futebol para jogar com o Nacional (time juvenil), no município de Manacapuru-AM. Não me lembro do resultado da partida.

Na quadra de esportes eram realizados jogos de vólei e futebol de salão, contra equipes de colégios. Uma temporada bastante movimentada e com muita alegria para todos.

Como já falei e, festas comemorativas, vinham muitos cantores como Roberto Leal. Agnaldo Timóteo, Esther de Abreu, Francisco José, Gilda Valença, Moacir Franco e muitos outros.

Sr Manuel Ribeiro, ex-diretor do Luso, pai da Sra Maria Albina. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

As festas juninas também tiveram período de glórias. Muitas alegrias atingiram o auge. Vinham quadrilhas, danças folclóricas, bois-bumbás, dança do cacetinho, pássaros, etc. Muitas iguarias da época eram servidas. A grande atração era o cantor português Roberto Leal, que abrilhantava as festas com muita animação e satisfação, principalmente para a Colonia Portuguesa. A minha trajetória pelo Luso foi muito significativa e brilhante. Na minha cadeira de descanso, fico recordando tempos felizes que jamais esquecerá. Foi uma grande parte da minha vida, por sinal bem vivida.

Sempre fui muito responsável e por realizar os meus trabalhos com amor e humildade a direção do Luso me agraciou com um Oficio, destacando elogiosamente os meus relevantes serviços prestados a sociedade, assinado pelo 1º secretário da Assembleia-Geral, o sr José dos Santos Gonçalo (falecido). A seguir fui distinguida com um Diploma de Sócia Honoraria, podendo gozar de todos os direitos e regalias desta sociedade, assinado pelo presidente, o sr. Antônio Mathias dos Santos, pelo 1º secretário, sr. José dos Santos Gonçalo pelo tesoureiro o sr. Ivan Ferreira Valente (falecido). Foi para mim uma grande honra o recebimento desse diploma.

Por tudo isso, agradeço a Deus os momentos felizes que passei nesta grande sociedade com grandes companheiros de Escola e do Corpo Cênico.

Observação: Não podia deixar de ressaltar verdadeiros baluartes, colunas concretadas que ergueram a sede do Luso Sporting Club, com amor, dedicação e muito trabalho. Lembrando alguns desses trabalhadores e fundadores da sede: Antônio Mathias dos Santos, Armindo Dias Soares, Afonso Siqueira, José Lameiras, José dos Santos Gonçalo, Ivan Ferreira Valente, Antônio Martinho dos Santos, Manoel de Oliveira e Silva, Antônio Mendes e muitas outros.

Os atuais dirigentes estão dando nova roupagem ao Luso, na esperança de dias cada vez melhores para o orgulho de seus associados e simpatizantes. Imorredouras Saudades! 

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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