Cachoeira Porteira no Pará já é a maior terra quilombola titulada do Brasil
O Pará é o estado brasileiro que mais titulou áreas em prol dos remanescentes de quilombos em todo o Brasil. Um avanço e um reconhecimento histórico para aqueles que tanto fizeram pelo país desde a sua colonização. Somente nos últimos três anos, o Governo emitiu cinco títulos coletivos; o mais recente foi entregue na comunidade Cachoeira Porteira, localizada em Oriximiná, região oeste do Pará. “É uma conquista que buscamos desde o tempo dos nossos ancestrais, e não temos palavras para descrever esse momento, que é muito importante para todos nós”, declarou a agricultora Maria da Costa.
O título coletivo ratifica que 225 mil hectares pertencem às 145 famílias remanescentes de quilombos que vivem em Cachoeira Porteira. A titulação ocorreu pela desafetação de parte das florestas estaduais (flotas) de Trombetas e Faro, aprovada pela Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) e sancionada pelo governador do Pará, Simão Jatene. A área chama a atenção pela beleza natural do Rio Trombetas, que margeia a comunidade e, sinuosamente, se impõe em cachoeiras, corredeiras e igarapés emoldurados pela floresta amazônica.
“Aí nesse rio tem toda qualidade de peixes. Na floresta tem tudo o que a gente precisa para viver. Se a pessoa quiser dormir na rua, não tem nada que lhe incomode, no máximo um ou outro morcego”, garantiu Valdemar dos Santos, 84 anos, nascido e criado em Cachoeira Porteira. “Com muito orgulho”, reiterou Valdemar, um dos moradores mais antigos da região. Segundo ele, “aqui é terra de negros. Era pra cá que os escravos fugiam dos brancos, e assim foram construindo tudo o que temos hoje. Não troco isso por nada”.

A artesã Maria Isabel do Carmo concorda com Valdemar. Com a habilidade daqueles que nascem com o dom de manter viva uma tradição, ela manipula palha e cipó, que trançados e coloridos ganham formas de peneiras, cestos e tipitis (instrumento para espremer a mandioca e retirar o tucupi). “Sinto muito orgulho de manter vivo esse artesanato, que era feito pela minha mãe e minha avó. A gente precisa manter a nossa cultura para as próximas gerações”, reiterou Maria Isabel, que já estimula a neta Cássia, 4 anos, a trilhar o mesmo caminho.
Para ela, o título coletivo é uma ferramenta na garantia dessas tradições. “Fico emocionada com a chegada desse documento. É uma importância muito grande pra nós, que esperamos tanto por esse momento de poder dizer que a terra é nossa. É pra nós, nossos filhos e netos”, disse Maria Isabel.

Ser expulso do lugar onde nasceu era um dos maiores temores do agricultor Manuel Marcos dos Santos. “É muito ruim viver desse jeito, sempre achando que a qualquer momento poderiam nos tirar daqui. Agora o negócio mudou. A gente está com o título na mão, ninguém mexe com a gente. Estou muito feliz”, declarou.
Para o presidente da Associação de Moradores da Comunidade Remanescente de Quilombo de Cachoeira Porteira, Ivanildo Carmo de Souza, o título coletivo de terra é a realização de um sonho, resultado do esforço conjunto, da dedicação de toda uma comunidade. “Foram 23 anos de luta, muito empenho e parceria de todos. Como todos se envolveram, nós tivemos força para lutar por um direito que é histórico, e hoje estamos vendo acontecer”, destacou.

Cachoeira Porteira está a 13 horas de barco e 4 horas e meia de lancha da sede do município de Oriximiná, no oeste paraense. “A comunidade vive de pequenas roças e da extração de castanha do Pará”, informou o prefeito de Oriximiná, Ludugero Tavares, para quem o título vai melhorar a vida dos quilombolas. “Essa é uma das comunidades mais distantes do município. Parabenizo o governador por esse feito, e pela parceria com o município na manutenção desse território”, frisou o prefeito.
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