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Quinta, 18 Abril 2024

Amazonas falha no combate à violência sexual contra crianças e adolescentes

MANAUS – “O Amazonas faz pouco para combater à violência sexual contra crianças e adolescentes”. A afirmação é da assistente social e vice-presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca) do Amazonas, Ana Paula Angiole. No próximo dia 18 de maio, o Brasil fará uma série de mobilizações em alusão ao Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes.

Para Ana Paula não basta um dia. “Nós temos que estar sempre atentos e não podemos nos omitir. O abuso sexual de crianças e adolescentes não pode mais ser avaliado somente na perspectiva vítima-abusador. Existe uma série de variáveis dentro do contexto em que os dois estão inseridos”, avalia.


A assistente social Ana Paula Angiole. Foto: Izabel Santos/Portal Amazônia

Em entrevista do Portal Amazônia, a vice-presidente do Conselho questiona o perfil deste tipo de violência no Amazonas, onde as vítimas trocam favores sexuais, ou são induzidas a isso, por comida. Em 2015, 30 dos 61 municípios do interior do Amazonas registraram 132 casos, sendo que Itacoatiara (24), Manacapuru (11) e Presidente Figueiredo (10) tiveram maior incidência. Anamã, Careiro da Várzea, Iranduba, Itamarati, Lábrea e Pauini apresentaram apenas um registro.

No mesmo ano, o Amazonas teve 9.749 casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes em processos judiciais. Além disso, cerca de quatro mil novas ações relativas ao assunto foram protocoladas no Tribunal de Justiça do Amazonas (Tjam), um crescimento de 66% em relação a 2014.

Como solução, Ana Paula aponta entre outras medidas, a efetiva implantação dos Planos Municipais de Enfrentamento violência sexual contra crianças e adolescentes, integralidade das políticas públicas e posicionamento baseado nos princípios dos Direitos Humanos.

Portal Amazônia – Como você avalia o enfrentamento ao abuso sexual contra crianças e adolescentes no interior do Amazonas?

Ana Paula Angiole - O interior do Amazonas é um pouco abandonado. Diferentemente de Manaus, ele não contempla a rede de uma forma geral, e acaba não sendo atuante. A rede é esfacelada e os órgãos que deveriam proteger muitas vezes fecham os olhos para essa realidade. Há uma preocupação, porém não há uma efetivação das políticas públicas direcionadas para esse atendimento

Portal Amazônia – E em Manaus, a situação é melhor?

Ana Paula Angiole - Em Manaus a rede é mais consolidada, mas vive um processo de precarização, principalmente, no processo de investimento dentro dos espaços para atendimento de crianças vítimas de violência sexual. Por exemplo, temos espaços com uma equipe mínima e uma demanda imensa, onde os profissionais estão se tornando adoecidos porque não conseguem dar suporte às demandas que chegam até eles. Não há um equipamento do espaço como deveria ser e não há investimento nas políticas para efetivação desse trabalho junto a comunidade.

Portal Amazônia – O Estado falha no combate a estes crimes?

Ana Paula Angiole - A violência sexual dentro do Amazonas é algo que é visível aos olhos. A nossa sociedade fecha os olhos para esta realidade, tampa os ouvidos para os gritos de súplica destas crianças e adolescentes. Não percebe a violência tamanha que pratica contra este sujeito. É muito fácil eu culpabilizar somente a vítima, difícil é eu fazer uma análise da minha omissão enquanto responsável, enquanto cidadão de direito, enquanto pessoa que poderia fazer a diferença na vida de uma criança e de um adolescente ao denunciar e ao exigir das autoridades a aplicabilidade da lei. As nossas autoridades em geral, e eu me refiro principalmente a delegacia trabalha muitas vezes dentro do processo de precariedade. Há pouco tempo estava tendo uma reclamatória sobre as condições de trabalho da Delegacia de Proteção à Crianças e ao Adolescente (Depca). Nós temos situações em que os Conselheiros Tutelares não têm combustível para ir verificar uma denúncia. Imagina nos interiores?! A violência só vai ser percebida por nós quando ela bate a nossa porta.

Portal Amazônia –As Organizações não-governamentais são mais atuantes?

Ana Paula Angiole - As ONGs são mais sensíveis e estão mais próximas a ponta. Dentro das comunidades elas se fazem mais presentes. O trabalho das ONGs dentro do processo de levar informação e sensibilizar a comunidade é mais atuante. Ele não acontece em um momento único, mas durante todo o tempo no contato com as famílias. No Amazonas temos muitos profissionais que são referência nesse trabalho como a psicóloga Consuelena Lopes Leitão; a Amanda Ferreira, presidente do Instituto de Assistência à Criança e ao Adolescente Santo Antônio (Iacas); as irmãs do Grito pela Vida, que vão aos locais mais longínquos possíveis. São pessoas que vestem a camisa e acreditam que, mesmo sendo um trabalho de formiguinha, se nada for feito, pior ficará.

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